Viver entre dois mundos
como quem segue e conduz tênues fios de luz,
que me levam a um passado distante.
Nesse ir e vir vou fechando feridas,
estancando hemorragias,
cuidando de mortos,
num trabalho meticuloso
quase cirúrgico.
Salvo almas,
ou pedaços de almas,
de um tempo congelado,
amargo e talvez cruel.
Como se fosse este meu destino,
uma caminhante entre dois mundos,
paciente e calmamente,
salvando aqueles que fui um dia.
De tanto me abeirar do outro lado do rio,
a tarefa se fez prazerosa,
e os mortos se fizeram amigos.
De nada me assusto,
apena conduzo,
chamo os santos para nos assistirem,
eles é que fazem tudo.
Eu sei que parece estranho,
e a ninguém falo,
deste destino inusitado.
Mas lá no fundo agradeço,
a Deus, ao universo,
curar mil vidas em uma,
dar mil passos,
em equilíbrio,
numa estreita esteira que entremeia
a vida e a morte.
Ana Liliam
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